quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O que se faz quando a alma nos cai aos pés?




“A alma me caiu aos pés” é uma expressão espanhola que eu conheci através de um dos meus escritores favoritos, o madrilenho Jorge Semprún.

Educado em francês e alemão, apaixonado pelas palavras, Semprún é fascinado pelo que essa expressão descreve com exatidão: o momento aterrador em que nosso mundo vem abaixo, o instante em que nos vemos nus diante da realidade acachapante.

Lembro que a alma me caiu aos pés numa noite chuvosa de terça-feira, em São Paulo.

Eu havia saído com a namorada e tivemos um desentendimento repentino, explosivo, desses que termina em gritos e lágrimas sem que qualquer um dos dois tenha (ao menos conscientemente) intenção de romper e causar dano.

Discutimos no carro, a caminho de um restaurante, e retornamos à casa dela sem nos olhar. Eu a deixei sob a luz amarelada do prédio. Tão logo acelerei o carro, furioso, aconteceu: a alma me caiu aos pés.

De um só golpe me veio, inteira, a importância daquela mulher na minha vida. O mundo sem ela ficou instantaneamente vazio de sentido. A amargura subiu pela garganta e me dominou a ponto de quase impedir o ato de guiar.

Sei que cheguei em casa e me larguei na poltrona, sentindo as coisas ruírem à minha volta. Eu me sentia inteiramente só. E apavorado. Pensei: como se vive com esse sentimento?

Antes que eu tivesse chance de descobrir, ela telefonou.

Conversamos cautelosamente, como dois bichos feridos: um percebendo no outro, pela primeira vez, o potencial de causar dor. Como não havia nada realmente errado, as coisas se resolveram e a ordem do universo foi restaurada. A vida voltou ao seu lugar.

Desde então, porém, a pergunta me persegue: como se vive com tamanha dor? Como se lida com o reverso do amor?

Tenho uma amiga que terminou outro dia um namoro bonito, com um sujeito devotado, e se encontra inteiramente tranquila. Na verdade, está feliz por ter mais tempo para si mesma.

Tenho outra amiga que é inteiramente diferente. Ela terminou um namoro ruim e está em farrapos: não consegue estar só e sentir-se bem.

A maioria dos homens que eu conheço pertence ao segundo grupo.

Diante de um rompimento indesejado, eles desabam. Correm para o bar, enchem a cara, ligam para todas as mulheres da cidade, fazem o maior barulho possível. Se apavoram.

Sempre tive a impressão de que pertencer a esse grupo era a única maneira de existir. Do lado dos sóbrios e tranquilos, eu pensava, só há gente fria. Gente que eu não queria ser.

Hoje penso ligeiramente diferente. Tendo sentido a alma nos pés mais de uma vez, me parece invejável a capacidade de algumas pessoas de estar no centro da própria vida permanentemente – em vez de deixar que outro ser humano ocupe esse lugar essencial.

Quando as relações terminam, essas pessoas saem quase intactas. Vão recuperar sozinhas a própria integridade. Sem pânico. Sem drama. Isso significa que se divertiram menos no caminho? Significa que gostaram menos? Talvez. Ou talvez signifique, apenas, que são mais equilibradas.

Assim como a sombra, talvez a alma devesse estar colada ao corpo permanentemente. Deve haver algo de errado com uma alma que vive caindo nos pés.


Belíssimo texto de Ivan Martins... Só gostaria de acrescentar que é uma delícia ter a alma grudadinha ao próprio corpo.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Mas eu me mordo de ciúme...


“Meu bem me deixa sempre muito à vontade
Ela me diz que é muito bom ter liberdade
Que não há mal nenhum em ter outra amizade
E que brigar por isso é muita crueldade
Mas eu me mordo de ciúme
Mas eu me mordo de ciúme”

Quem não se lembra dessa música da banda Ultraje a Rigor que embalava as festinhas dos anos 80??? Pois é... O ciúme... Sempre o ciúme!!!

Há uma escola de pensamento chamada de Psicologia Evolucionista que sustenta que o ciúme seria herança da nossa longa evolução desde as savanas africanas.

Ao longo de um milhão de anos, a natureza teria aprimorado um "gene do ciúme" - para impedir que o macho fosse traído e perpetuasse a descendência dos outros - e ele continuaria funcionando ainda hoje, como um nódulo troglodita no meio do cérebro moderno. Mais uma tremenda baboseira evolucionista!!!

Um artigo da Newsweek demole esse álibi. Mostra que o cérebro humano não evoluiu por nódulos de pré-programação. Ele se adapta livremente ao ambiente que o cerca. Em nosso caso, à cultura.

É por isso que um liberal sueco e um talibã afegão têm atitudes diferentes diante do ciúme. O sueco assume a liberdade e a independência da parceira e vive com as conseqüências disso. O talibã acredita que pode matar diante de uma ameaça à sua honra.

Não há nódulo de ciúme: há cultura, educação e, como sempre, livre arbítrio. Homem nenhum é obrigado por forças genéticas a portar-se como louco, sobretudo em uma cultura flexível como a do Brasil. E nenhuma mulher é forçada por genes ancestrais a aceitar a truculência como fato da vida. Aceita quem gosta ou quem quer. Sempre que presencio cenas de ciúme, me questiono: por quê alguém aceita um parceiro ciumento???

Existe um outro lado dessa história: há mulheres, não poucas, que vêm nesse tipo de homem uma forma de se auto valorizar, são pessoas com baixa estima que precisam de um troglodita para se sentirem relevantes na vida de alguém. Buscam sentido. Além, claro, daquelas que apenas repetem padrões que vivenciaram em casa e que tomaram como realidade única.

Portanto, acredito que o ciumento existe pela complacência do parceiro. Realmente, tanto homens quanto mulheres confundem ciúme com amor. Claro que uma pequena demonstração de ciúme faz bem pro ego, mas os limites precisam ser estabelecidos.

Talvez por não fazer parte da minha natureza ser ciumenta, não tolero esse tipo de chilique. Um dos fatores que me fizeram rever a relação, e decidir terminá-la, com o meu ex namorado foi porque ele revirou o meu celular enquanto estava em minha casa e veio tirar satisfações. Comigo esse tipo de comportamento não se desenvolve, porque não dou espaço. Violência fisica, então, fora de cogitação, é caso de policia.

domingo, 2 de agosto de 2009

O passado que fica


O texto a seguir foi escrito por Ivan Martins, Editor-executivo da revista ÉPOCA, ele escreve sobre os variados temas que afetam a nossa vida emocional, fazendo uma releitura sob a ótica masculina de forma muito verdadeira e sensível.
Vale a pena conferir:


"Homens, mais do que mulheres, têm dificuldade em deixar que as coisas passem

Eu sempre tive dificuldade em separar passado e presente.

Ao contrário de uma ex-namorada de quem eu gosto muito, que se gaba de olhar apenas para frente, eu sofro desde adolescente de torcicolo existencial: vivo olhando pra trás, fascinado e (às vezes) apaixonado pelo passado.

Percebi essa dificuldade pela primeira vez ao fim de um período de quatro anos fora do Brasil: eu só conseguia pensar na garota por quem eu fora louco na adolescência.

Liguei da Inglaterra para a casa da mãe dela (ainda sabia o número de cabeça...), atualizei a ficha da moça (casada, dois filhos) e telefonei dias depois, com o coração aos pulos, para ter com ela uma conversa doce e ... inútil.

Descobri que aos 30 anos não se pode recuperar nada de uma paixão que se teve aos 13.

Mais tarde, deparei com a mesma dificuldade em outra circunstância. Depois de anos de namoro, apaixonado, levei um pé na bunda e gastei anos dolorosos (sim, anos!) tentando fazer o tempo voltar. Inutilmente.

É engraçado como as pessoas que sofrem da doença da nostalgia criam desculpas para se justificar.

"Ninguém é como ela". "A gente ainda tem uma relação". "Foi a pessoa mais importante da minha vida". "Enquanto eu gostar dela não vou gostar de outra pessoa". E por aí vai.

Os amigos cansam de ouvir a ladainha. O analista vira testemunha remunerada de um luto que não acaba. Até a família perde a paciência. Uma tristeza.

Minha experiência sugere que os homens são mais propensos a isso do que as mulheres. Ou pelo menos o tempo deles é diferente. Quer dizer, pior.

Mulheres sofrem intensamente e saem rápido da dor, prontas para outra. Ou assim parece. Os homens chafurdam, derrapam. Ficam semanas, meses, anos atolados na mesma crise. Por comparação, as mulheres parecem mais práticas. Ou mais resolutas.

Por que será? Acho que há nisso uma coisa edipiana. Perder a mulher que se ama talvez seja como perder a mãe. Ou ser abandonado por ela. E mãe, todos sabem, só existe uma.

Ou talvez as mulheres (por formação familiar, por cultura de grupo, até, quem sabe, por genética), tenham aprendido a não depender emocionalmente dos parceiros para além da medida do bom senso.

A despeito da imagem romântica e sentimental, (e do seu próprio discurso de fragilidade) tenho visto que as mulheres se aguentam muito bem.

Afinal, elas são o esteio das famílias desde a savana africana e não podem se dar ao luxo de gastar a vida gemendo pelos cantos. Há que seguir, marchar, fazer a prole;

A vida (talvez o relógio biológico da maternidade) empurra as mulheres à construção prática do mundo. Os homens têm tempo a perder e o perdem. Às vezes a vida inteira.

Dito isso, as coisas mudam. A vida ensina. Observo os meus amigos nostálgicos, aqueles que pareciam incorrigíveis, e percebo que eles aprenderam a cortar a corrente do passado.

Eu mesmo, depois de centenas de sessões de análise, depois do acúmulo das experiências, me surpreendo com uma capacidade nova de apreciar o presente. Capacidade que antes, me parece, não estava inteiramente lá, como não está na vida de muitas pessoas, homens e mulheres.

O passado continua uma presença forte. Ele molda o dia de hoje mas não o determina inteiramente, não o impede e, sobretudo, não o substitui.

Ou, como diz aquela ex-namorada que não olha pra trás: se você não quer que uma relação entre para o passado, é bom cuidar dela no presente; é bom garantir que ela esteja lá, no futuro. Faz todo sentido."

sábado, 1 de agosto de 2009

Sempre há tempo para amar


"Me sinto como uma adolescente desde que eu o conheci". Foi assim que a boliviana Irma Rodríguez, de 73 anos, descreveu à BBC seu sentimento em relação a seu amado, o aposentado Jorge Carillo, de 63 anos. Os dois viveram um amor proibido. Moravam em alas separadas em um asilo em La Paz, na Bolívia, quando se conheceram. Só saíam da casa uma vez por mês, para receber a aposentadoria.

Nesses encontros bancários, se apaixonaram. Do banco, passaram a ir para a lanchonete, a sorveteria. Divertiam-se como duas crianças nessas esticadas furtivas que só aconteciam nos dias de pagamento. A paixão era tanta que às vezes escapavam uns beijinhos. Dois anos e meio de romance e uma funcionária do asilo os pegou nesse ato de amor: os dois idosos de lábios colados. Muita confusão e em maio passado, Irma e Jorge resolveram deixar o asilo.

"Como Romeu e Julieta não pensamos nas consequências", disse Irma.

Com pouco dinheiro no bolso, tentaram vários alojamentos, mas não conseguiram. Chegaram a ir para outra cidade, Cochabamba, mas nada. Cansados de procurar moradia, Carrillo voltou a morar com a família (que desaprova o namoro). E Irma foi para um asilo feminino. O Serviço de Gestão Social de La Paz pediu uma investigação sobre o caso.

Sem celulares, porque venderam os aparelhos para ter mais dinheiro, ficou mais difícil os pombinhos se encontrarem. Irma disse à BBC que ainda tem esperanças de os dois morarem juntos. “Não quero me separar dele. Ele também não quer. Eu o amo. Acho que, se isso acontecesse, eu morreria”, disse.

Fiquei muito comovida com essa história, porque acredito que amor não tem idade para acontecer. Esse casal de bolivianos são mesmo Julieta e Romeu dos tempos modernos. E mais, um amor proibido na terceira idade.